Derivado diretamente da renovada onda New Age e de antigas e filosóficas tradições, o auto-conhecimento é um tema hoje muito popular nos ambientes que orbitam a vasta área da Administração.
Stephen Covey, por exemplo, foi um pioneiro nessa temática e na da ética no mundo dos negócios, com o best-seller, já com mais de 20 anos “The Seven Habits of Highly Effective People” (1989), editado no Brasil como “Os sete hábitos das pessoas altamente eficazes”. As redes sociais e o mercado estão repletos de soluções de auto-conhecimento, auto-ajuda gerencial (?!), self-coaching, etc., frequentemente apresentados como recursos infalíveis para uma liderança de sucesso mas, também frequentemente, fracamente sustentados em conceitos sólidos e num conhecimento prático e efetivo do meio empresarial.
Porém, como em todas as receitas, não existem milagres, senão os derivados do talento de cada um: o auto-conhecimento pode ser interessante e benéfico como disciplina de aperfeiçoamento pessoal, mas entre o domínio individual e sua aplicação no seio das organizações existe alguma orografia a ter em conta e, portanto, algumas pontes e túneis para construir antes de esperar por resultados imediatos. Com efeito, é necessária alguma cautela no que respeita à avaliação da eficácia real de muitas dessas soluções – frequentemente apresentadas como milagrosas e infalíveis – no seio das organizações.
Assim como o coletivismo puro não funciona, porque carece de lideranças individuais e do jogo polar entre estas e o grupo, a liderança individualista também não funciona, ainda que recheada de boas intenções, incenso e cristais, porque boas intenções e algumas “técnicas” aprendidas em workshops vapt-vupt podem travestir falta de sensibilidade, de bom senso ou de maturidade.
O elemento humano é, sem dúvida, o mais importante em todas as organizações, incluindo aquelas onde domina a vertente técnica, tecnológica ou financeira. E obviamente, na Gestão ou Administração. Seres humanos mais aprimorados, mais resolvidos interiormente, com visão mais larga e menos centrados no reduzido campo de visão de seu umbigo, tendem a ser líderes mais esclarecidos, mais humanos, mais justos – e mais eficazes. Mas nem sempre isso acontece e, quando acontece, não acontece logo, porque nem sempre o líder está no lugar certo dentro da organização, nem sempre ele possui uma equipe adequada, nem sempre seu aprimoramento individual é efetivo, com ou sem coaching. O que formula uma equipe de sucesso não é apenas um bom líder, mas uma boa equipe, dentro da qual existe cada um de seus membros considerados individualmente.
A interação e a distribuição das complementaridades dentro da equipe são fatores importantes, entre outros. O que importa na busca de desempenho e resultados num dado projeto parcial ou institucional, ou na operacionalização das estratégias institucionais é sempre a eficácia do sistema e de cada sub-sistema como um todo. Por outras palavras, há que levar em conta as interações entre a organização e o líder, entre este e o grupo, e entre os anteriores e cada elemento do grupo como indivíduo distinto dos demais. E vice-versa. Portanto, trata-se de um cenário complexo que, ou será liderado de um modo sistêmico, ou não apresentará os resultados desejados. Muitas vezes, no ambiente certo, um membro do grupo a que ninguém dava importância surge com uma ou mais soluções inesperadas e com uma atitude forte, proativa e esclarecida; as “estrelas” do grupo se sentem abaladas em sua presunção; como deverá reagir o líder e os demais membros do grupo em situações desse tipo?
Acredito que, mais do que soluções New Age de auto-conhecimento individual, uma equipe harmônica, com conhecimento do que está fazendo e com foco nos objetivos, só pode dar bons resultados. Dentro do ambiente da organização, o auto-conhecimento pode ajudar, mas não como resultado de uma mística pessoal ou como uma nuvem cor de rosa que vai resolver todos os problemas depois do cursinho ou do ciclo de palestras: talento é preciso para lidar com pessoas, cada uma diferente da outra, cada uma com seus talentos, sonhos, aspirações, objetivos individuais. Por outro lado, numa organização saudável e bem gerenciada, os objetivos individuais de cada colaborador em cada função devem estar o mais possível alinhados com os objetivos da organização: em cada projeto, também; em cada objetivo estratégico, também; na execução e operacionalização da estratégia, também; para que possam advir resultados.
Afinal, buscar objetivos comuns, entender as diferenças dentro da equipe, compartilhar sucessos e derrotas com seus componentes, equilibrar excessos, talvez funcione melhor como disciplina de auto-conhecimento para o próprio líder do que… muitas soluções disponíveis no mercado dos milagres corporativos.
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